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Meu Irmão Herbinho

PESSOAS
Autor: Fernando Pinto de Carvalho

Meu Irmão Herbinho

 

 

Meu irmão Herbert, ou Herbinho, como todos o chamavam, era alegre, brincalhão, engraçado e comunicativo. Ele era o sexto de uma família de 10 irmãos, e eu era o oitavo. Ele tinha baixa estatura, cabelo um pouco encaracolado e rosto normal. Não era bonito nem feio. Não era, também, daqueles que chamavam a atenção das mulheres. Na casa dos nossos pais, ele era o mais divertido e barulhento. Ele fazia batuques com pandeiros, tambores e tamborins improvisados a qualquer hora, desde que o nosso pai não estivesse em casa. Ele cantava, dançava, imitava Oscarito, Ankito, Cantinflas, Jerry Lewis. Uma vez ele tentou aprender música com o maestro Evilásio e começou a tocar saxofone em casa, com o nosso irmão Hugo, que tocava trompete. Mas ele logo desistiu do curso de música e voltou aos seus instrumentos caseiros.

Ele gostava de caçar com espingardas. No começo ele usava aquelas de carregar pela boca do cano, que tinham que ser recarregadas a cada tiro com pólvora, bucha e chumbo. Depois ele comprou uma espingarda de cartuchos, mais prática. Eu era 6 anos mais novo do que ele, mas era o seu principal companheiro nas caçadas de patos, quem-quens e mergulhões que ele fazia no Açude do Jenipapo. Para caçar os patos ele fazia “esperas”, que eram trincheiras onde ficávamos escondidos esperando a caça chegar. A caçada dos mergulhões era mais difícil, porque eles ficavam na água e mergulhavam muito bem. Era difícil acertar um tiro nos mergulhões e quando isso acontecia tínhamos que nadar até eles para pegá-los. Já os quem-quens voavam baixo em bandos enormes e o Herbinho só precisava atirar no meio. Como a espingarda usava chumbos, eles se espalhavam e às vezes acertavam até 5 de uma vez.

No seu tempo de jovem solteiro, o Herbinho foi um grande namorador. Ele dançava bem forró, samba e baião, e era sempre alegre e comunicativo. Ele atraía e conquistava as garotas com facilidade. Ele não era exigente na hora da escolha e teve muitas namoradas de todos os tipos: aceitáveis, mais ou menos, bonitas, lindas. Ele dizia que o importante era ser mulher. Ele estava certo e se fosse hoje, estaria mais certo ainda. O assunto namoro e chamegos do Herbinho daria para encher muitas páginas deste texto, mas vou parar por aqui e voltarei ao assunto ocasionalmente.

Ele trabalhou no DNOCS, no DERBa como apontador nas obras de limpeza e alargamento da estrada que liga Itiúba a Filadélfia, foi motorista profissional e teve o seu próprio caminhão depois. Era um Chevrolet da década de 50, apelidado de Cara de Sapo, que ele usava para transportar materiais de construção e outras mercadorias na cidade. Mais tarde ele comprou alguns tonéis de aço de 200 litros e começou a transportar água do Açude de Camandaroba para a cidade, onde era entregue às pessoas que a encomendavam antecipadamente. Ele descobriu que essa atividade era rentável e passou a fazer esse tipo de transporte quase que exclusivamente. Às vezes ele fazia até quatro viagens por dia. Um dos seus ajudantes era chamado de Enterrado e o outro de Negão Osmar. Eles também eram engraçados e formavam com o patrão o Trio da Alegria, da Piadinha e da Pegadinha.

O Herbinho era um ano mais velho do que seu irmão Hugo e eles sempre foram muito unidos. Eles saíam juntos, brincavam juntos. Quando chegou a vez do Herbinho ir para a Escola Goes Calmon, que só aceitava crianças com idade igual ou superior a 7 anos, surgiu um problema.

Nossos pais providenciaram a matrícula, compraram farda, livros e cadernos e ele foi ao primeiro dia de aula, mas voltou logo dizendo que só voltaria se o Hugo fosse também. Ele não podia, não tinha a idade exigida. O que fazer? Nossos pais tentaram convencê-lo com jeito, depois esbravejaram e até ameaçaram castigo, mas não adiantou nada e no final acabaram cedendo. No ano seguinte os dois foram juntos à escola, continuaram unidos, sempre foram bons alunos e nunca foram reprovados até o término do curso.

A pescaria era outra atividade que ele adorava. Quando os rios, riachos e açudes estavam cheios, ele estava lá com seus anzóis e tarrafas. Nosso pai, que também gostava de pescar, fazia tarrafas para o próprio uso e o nosso irmão pescador, com um professor tão bom e tão próximo, logo aprendeu essa arte e começou a fazer as suas também.

Ele criava um novo apelido fazendo o uso de qualquer coisa, qualquer acontecimento, qualquer palavra diferente usada ou qualquer comparação que achava adequada. Ninguém escapava, nem mesmo os próprios irmãos. O Hugo era chamado de Sancho Panza, porque lia sempre em voz alta o livro Dom Quixote de La Mancha quando a professora pedia; o Wilton de Genibaldo, porque era magro como um vizinho que assim se chamava. Nem eu escapei. O maestro da Filarmônica local, que se chamava João Cosme, andava sempre com as roupas amarrotadas e como o Herbinho achava que eu - quando era criança - andava assim também, me chamava por esse nome. A sorte dos apelidados era que esses nomes ficavam restritos ao próprio autor deles, ou seja, ao Herbinho que nunca os esquecia.

Voltando a falar sobre os namoros, tenho mais uma história do Herbinho para contar. Na volta de uma de suas viagens à Camandaroba, ele trouxe no caminhão uma namorada que tinha lá. No caminho, um comerciante e fazendeiro da cidade, senhor respeitável, casado, pai de quatro filhos, pediu carona. O Herbinho não pôde recusar e colocou a moça no meio do banco da cabine do caminhão, bem pertinho dele, e o Seu Pedro ao lado, perto da porta. Durante o percurso o motorista namorador conversou bastante, contou piadas, fez algumas imitações do Oscarito e Seu Pedro, mesmo sem querer, acabou rindo um pouco. Assim, se aproximaram da cidade e tiveram uma grande surpresa quando chegaram à Calçada de Pedra, na entrada da cidade. A outra namorada dele, que já desconfiava dessas viagens frequentes, resolveu esperá-lo para tirar satisfações, bloqueou a frente do caminhão e, furiosíssima, mandou os dois descerem. O Herbinho desceu sozinho, como se nada estivesse acontecendo, e disse: - Calma, calma, meu bem! Assim você vai deixar Seu Pedro sem graça. A moça é namorada dele e ele casado, como você sabe…

Assim era meu irmão, meu amigo, meu camarada…





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