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O Cinema e a Nossa Família
CINEMA
Autor: Fernando Pinto de Carvalho
Desde a sua invenção, no século XIX, o cinema mantém uma relação com as cidades, benéfica para ambas as partes. O meio urbano foi onde o cinema encontrou o apoio para o seu crescimento e aperfeiçoamento.
Em uma pequena cidade, situada no interior da Bahia, chamada de Itiúba, porém, além dessa relação urbana, o cinema contou, ainda, com uma importante relação familiar. Tudo começou com o dinamismo do Sr. Manoel Pinto Primo, que em 1934 instalou o cinema mudo em um prédio próprio, moderno, especialmente construído para atender as exigências de espectadores de cinema, teatro e shows e recebeu o nome de Cine Teatro Ideal. Pouco tempo depois, o grande empreendedor Itiubense trouxe o recém-criado cinema-falado, uma proeza que até cidades maiores não conseguiram na época. Durante os próximos anos o cinema contou com o apoio total da população e só a partir de 1939, com o advento da Segunda Guerra Mundial e com a iminente participação do Brasil no conflito, o Sr. Manoel Pinto, prudentemente, começou a desativar os seus empreendimentos na cidade, incluindo o cinema em 1940.
Em 1947 o Sr. Almir Ferreira, Itiubense de família tradicional, arrendou e reativou o velho cinema que funcionou até 1953.
Em 1954 o cinema e a família Pinto voltaram a se envolver, agora na figura do Sr. Humberto Pinto de Carvalho, sobrinho do Sr. Manoel Pinto. Ele alugou o velho prédio que ainda pertencia ao seu tio e, após uma pequena reforma que manteve as características do projeto original, reabriu o cinema. Tarzan, Rocky Lane, Doris Day, Anna Sheridan, James Cagney e Errol Flynn voltaram a fazer parte da imaginação e dos pensamentos lúdicos de mulheres, homens, jovens e crianças da cidade. Logo o novo proprietário do cinema percebeu que o antigo prédio, mesmo com a recente reforma que sofreu, não oferecia condições de segurança e conforto aos seus frequentadores e teve que providenciar um novo local para transferir as instalações do cinema. Adaptou um prédio grande localizado na Avenida Getúlio Vargas - que era e ainda é a artéria principal da cidade - e lá reinstalou o cinema, agora com o nome de Cine-Itiúba. Contando com o apoio dos familiares na execução dos serviços normais necessários ao seu bom funcionamento e com a total aprovação do público, o Sr. Humberto fez o cinema prosperar e permanecer funcionando, com três sessões semanais, durante mais de 20 anos, encerrando as suas atividades, muitos anos depois da inauguração, após resistir, por algum tempo, as consequências da chegada da televisão aos lares brasileiros proporcionando a todos, gratuitamente e no conforto de suas casas, praticamente tudo o que o cinema apresentava cobrando ingressos.
Boas recordações temos daqueles tempos. A propaganda das suas atrações, por exemplo, era feita em tabuletas com fotos de divulgação e letreiros com o nome do filme em letras grandes e dos artistas principais, logo abaixo, em letras menores. Essas tabuletas eram colocadas nos locais mais movimentados da cidade e esse sistema promocional diferente, sempre funcionou, mas, quando o filme a ser exibido era famoso e mais caro, exigia, consequentemente, uma investida mais agressiva e, então, dois ou três garotos recebiam ingressos gratuitos para em troca, percorrerem a cidade toda carregando as tais tabuletas e batendo um martelo numa enxada de ferro, com força, fazendo um barulho ensurdecedor que chamava a atenção de todos. A propaganda também era feita pelo Serviço de Alto-Falantes do próprio cinema e, certa vez, um locutor - que talvez tenha sido eu - na pressa, pegou o folheto de propaganda errado e, se referindo ao filme que seria exibido no dia, anunciou: "naquele território o ruído das balas era o único som que se ouvia". Ah! O povo gostava demais de filmes de bang-bang com bastante tiros e o cinema encheu. Aconteceu, para a angústia do entusiasmado locutor, que o filme exibido era outro, chatíssimo, não tinha tiro nenhum e o coitado do locutor, quando a sessão acabou, teve que ficar escondido, esperando que todos saíssem para poder ir para sua casa sem ouvir os irritados e justificáveis protestos do público.
Existem muitas histórias do Cine-Itiúba para contar, mas vou contar só mais uma. O cinema, no início, dispunha apenas de uma máquina de exibição e quando o filme estava sendo exibido e ela quebrava, tinha que ser consertada na hora para que o cinema não fosse obrigado a devolver o valor dos ingressos, pois o tempo de permanência contratado do filme não permitia que outra exibição fosse programada. Mas, o exibidor, que era o próprio proprietário do cinema, era, também, um perito em rapidamente consertar a máquina que ele conhecia peça por peça, manha por manha. Todos sabiam disso, todos gostavam do cinema, todos gostavam dos administradores e da administração do cinema e aguardavam silenciosa e respeitosamente até o retorno da exibição. Mas um dia o pior aconteceu e mais de meia hora depois, o problema ainda não havia sido solucionado. Um forasteiro que se encontrava presente, sem entender porque ninguém protestava, começou a gritar: MEUS QUINZE… MEUS QUINZE… MEUS QUINZE.. Quinze cruzeiros era o valor do ingresso. O proprietário-exibidor, já irritado porque dessa vez não conseguiu descobrir e consertar o defeito, ouvindo aqueles protestos, que ele não costumava ouvir, não se conteve e se dirigiu ao local de onde os gritos estavam vindo. Quando todos que estavam na sala de exibição perceberam, trataram logo de acompanhá-lo e o solitário protestador, em tapas e empurrões, levou bem mais do que os quinze que queria...
Eh!... meus amigos e minhas amigas, naqueles tempos, naquelas bandas e naquela situação, direitos do consumidor ainda não existiam, não…
The End
(Nota do Autor: "Na redação deste texto, utilizei-me de informações contidas em crônicas sobre o assunto, publicadas neste site e escritas por Enock Pinto, por mim e pelos meus irmãos Hugo e Humberto Pinto de Carvalho).
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